Corte de 15% do FPM gera quebradeira em municípios de MT como Jangada
De acordo com a Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), a queda ocorreu em todos os repasses. O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) de 2016 teve uma redução de quase 15%. Na mesma linha, o Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), também retraiu 15% e a queda do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e prestações de serviços (ICMS) já chega aos 12%.
Para o presidente da AMM, prefeito de Nortelândia, Neurilan Fraga (PSD), quem vem sofrendo mais com toda a crise são os munícipios e a população que vive neles. “A crise política e econômica afetou diretamente as prefeituras porque é no município que mora o cidadão, ele precisa de serviço de qualidade, e eles cobram dos gestores municipais”.
Em busca de melhorar a situação econômica vivida pelo seu município, Neurilan chegou a baixar um decreto, no final de 2015, reduzindo o próprio salário pela metade, de R$ 6.877,40 para R$ 3.438,07. O mesmo decreto suspendeu também todos os DAS de comissionados. “Com as medidas que tomei, é possível viabilizar uma economia de pelo menos R$ 80 mil por mês, valor considerável em uma arrecadação mensal total de apenas R$ 700 mil”, explicou o prefeito, que também fez restrições orçamentárias como a redução do uso da frota de veículos, exceto aqueles necessários às ações que não podem ser descontinuadas: segurança, limpeza pública, ação social, saúde e educação.
A situação não é diferente nos outros munícipios pequenos do Estado. Em Salto do Céu (304 km de Cuiabá), o prefeito Wemerson Prata (PP), explica que a situação é cada vez mais preocupante, já que a arrecadação vem caindo consideravelmente com o impacto da crise financeira.“Um município igual ao nosso, que é pequeno, vive através dos impostos e agora só está caindo e afetando as grandes empresas, que deixamde arrecadar. Com isso, nós também deixamos de arrecadar. O município perdeu em um ano 19% de sua receita. A nossa principal solução até agora é o corte de gastos, porque não está sendo fácil manter as contas em dia”, ressaltou o progressista.
As cidades da baixada cuiabana também vem sofrendo com o impacto econômico. João Balbino(PR), prefeito de Rosário Oeste (103 km de Cuiabá), explica que municípios com a economia exaurida há menor arrecadação de impostos, o que dificulta a manutenção da receita da cidade.“Nós não temos um potencial produtivo e por isso somos os que mais sofremos. É visível que há menos consumo e com isso menos impostos, o que diminui a nossa arrecadação, já que com menos receita você não pode investir na cidade. Hoje nós priorizamos a folha de pagamento, alguns fornecedores, que não tem como atrasar, porque a gente tem medo de terminar o mês sem poder pagar nossos servidores.
Estamos gastando só os recursos que têm destinação própria como o Fethab, mas não conseguimos fazer nada de novo porque o recurso não dá”, explicou Balbino.
Na cidade de Confresa (1007 km de Cuiabá), a crise não afetou o setor comercial, mas para o prefeito Gaspar Domingos Lazari (PSD), o problema maior está na narrecadação do poder público. “Nós tínhamos uma cidade sem documentação. No ano passado, conseguimos titular mais de 1.500 propriedades. Essa titulação fortaleceu a arrecadação municipal e com isso hoje conseguimos burlar de certa forma a crise. Apesar disso, ainda precisamos dos repasses, porque qualquer ajuda que recebemos é muito importante para os municípios pequenos”, disse Gaspar.
Para Moacir Pinheiro Piovesan (PSB), do munícipio de Porto dos Gaúchos (475 km de Cuiabá), com a diminuição da arrecadação que é repassada pelo Governo Federal, não há como investir na cidade. “A crise tem que ser superada, mas tem que ter a participação de todos, município, Estado e Governo Federal, porque só assim nós conseguiremos investir mais em educação, saúde e segurança”.
A cidade de Guarantã do Norte (728 km de Cuiabá), onde 30% do comércio local são mantidos com a renda do funcionalismo público, e que também atende populares da região sul do Pará em tratamento médico, vem trabalhando principalmente com o corte de gastos para poder manter um bom atendimento à população. “Temos obrigações a cumprir, reposição salarial, piso de professor, gastos estruturais, tudo isso com a queda de receita e o aumento das despesas. É preciso ter um controle muito grande de gastos para que consigamos cumprir nossas metas, e não atrasar folha de pagamento”, explicou a prefeita Sandra Martins (PSB).
De acordo com ela, o FEX e o Fethab são auxílios essenciais para as cidades pequenas. “São os únicos recursos que tivemos no ano passado e esse ano é o que tem nos ajudado nas contas, justamente na prestação e no fechamento das contas anuais. Na minha gestão ajudou muito”.
Para ajudar na orientação dos gestores, a AMM realizou um encontro de prefeitos no qual abordou principalmente a crise nos municípios. O principal objetivo, segundo o presidente da Associação, é orientar os gestores nos cuidados com as contas e a necessidade de se trabalhar o aumento da receita própria. “Essencialmente nesse momento eu digo que é preciso economizar. É até ruim de se falar, mas é o momento que se deve até deixar de fazer certas obras para a população para que se termine o mandato de forma correta, sem deixar o município inadimplente”, explicou Fraga.
Para orientar os gestores, principalmente no último ano do mandato, o presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE) conselheiro Antônio Joaquim, ressaltou que a Corte deve analisar os casos de cada município, já que é público os atrasos nos repasses e o impacto da crise nacional, para que os prefeitos não fiquem inadimplentes em relação à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). “Nós sabemos das dificuldades que os munícipios vêm enfrentando. Vamos formular soluções que possam melhor avaliar as contas de cada prefeito. Será discutido caso por caso e vamos levar em conta principalmente se o gestor fez algo para tentar mudar a realidade de sua cidade, porque também é preciso buscar uma solução”, explicou o conselheiro.
O professor de direito da Universidade de Cuiabá (Unic), Orivaldo Peres, apresentou durante o evento o Programa de Incrementos da Receita Própria, que tem por objetivo melhorar a receita do munícipio através da tributação do ISS (Imposto Sobre Serviço) sobre a operação de cartão de crédito e débito. Com isso, o imposto seria recolhido aos cofres dos municípios onde ocorrem as vendas presenciais.“Os municípios passam por sérias dificuldades em questões de repasses de dinheiro, e nós temos instrumentos hoje, sugerimos criar uma metodologia e um sistema que os munícipios possam ter uma receita própria. Hoje através de estudos é possível melhorar a receita com uma parte da arrecadação do ISS, que pode ser uma grande fonte para o munícipio”, explicou o professor.
O principal objetivo, segundo Orivaldo, é fazer com que o município “quebre” o sistema financeiro já que o imposto está sendo exaurido, indo para paraísos fiscais, sem repassar nenhuma parte para as cidades. “O cidadão usa o cartão e o imposto não é revertido para o município e os prefeitos devem trabalhar para mudar isso”.