Denúncias apontam fraudes em aprovações e liberações do Fies na Unic

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Domingo, 04 Setembro 2016 | GazetaDigital
Denúncias de fraudes na aprovação de alunos mediante pagamento de propina e cobrança indevida de funcionários para liberação de contratos pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), envolvendo a maior universidade privada de Mato Grosso, a Universidade de Cuiabá (Unic), traz à tona série de irregularidades que estariam ocorrendo há pelo menos dois anos e que continuam sendo praticadas, apesar de protestos de alunos e professores. A universidade afirmou, nesta sexta-feira, que encaminhou o caso às autoridades policiais e instaurou um processo interno de sindicância.

Uma das denúncias foi feita com exclusividade pelo site Gazeta Digital, há uma semana. Após a veiculação da primeira matéria, envolvendo alunos do curso de direito, da unidade Pantanal, da Universidade de Cuiabá, sobre pagamentos para aprovação em disciplinas, novos relatos apontam que a mesma fraude ocorre também na sede Beira Rio, a mais antiga do grupo, há muito mais tempo. O principal motivo é que para se alcançar a renovação no Fies, o acadêmico precisa da aprovação em 75% das disciplinas. Sem alcançar esse percentual, iniciaria o processo de fraude envolvendo o financiamento do governo federal.

Os fatos já foram relatados em documentados à administração da instituição, afirmam professores e
alunos, que até então não havia aberto qualquer apuração interna para apurar ou impedir novas fraudes. Denúncias apontaram que vários estudantes, muitos sem as mínimas condições de aprovação, conseguem avançar no curso, mediante pagamento de propina a funcionários que têm acesso ao sistema de inserções de notas. O custo seria de R$ 800 por disciplina. Os responsáveis por tais fraudes teriam inclusive uma
rede para captar possíveis “clientes”. Há relatos de alunos que foram beneficiados pela aprovação fraudulenta e ao não concretizarem o pagamento, tiveram a aprovação “estornada”, como forma de pressão para que honrassem o compromisso.

Muitos alunos recorrem à prática criminosa pela grande vantagem financeira que oferece. Enquanto ele
teria que pagar R$ 1,8 mil para fazer novamente a disciplina, economiza tempo e dinheiro, pagando menos da metade do valor. As informações são que a prática não se aplica somente ao curso de Direito, mas abrange outros. Inclusive em cursos onde o valor das disciplinas é maior, como o de Medicina, a taxa da propina também seria proporcional. A inércia da instituição frente às denúncias que afeta toda comunidade acadêmica gera revolta, mas ao mesmo tempo intimida, principalmente professores que temem represálias, pelo fato de exporem a situação junto à imprensa ou mesmo a autoridades.

O motivo está no fato de não se sentirem de forma alguma amparados pela instituição para qual trabalham e que tem um nome a zelar. A situação se resume em um quadro de alunos apáticos e professores de mãos atadas, resume um dos denunciantes. Os números de beneficiados pelas fraudes são expressivos e em alguns casos chegam a 20 estudantes por disciplina. O fato da aprovação mediante fraude envolver alunos que são atendidos por programas de financiamento estudantil, com recursos do Governo Federal, torna a situação mais grave, ponderam os denunciantes. Entre a comunidade universitária, os “arranjos” são de
conhecimento público e fazem parte das rodinhas de conversa dos estudantes, afirma o vice-presidente do Centro Acadêmico do curso de Direito da Beira Rio, João Gabriel Bezerra Pinheiro Espósito.

Aluno do 10º semestre, disse que pessoalmente nunca foi abordado para a venda de aprovação, mas assegura que o fato é comentado por outros estudantes com naturalidade, como se o ato fizesse parte da vida escolar. A apatia dos alunos surpreende, tanto que o Centro Acadêmico ficou desativado por mais de dois anos e com muita dificuldade ele e um pequeno grupo de colegas conseguiram reativá-lo a partir de 2015.

A preocupação era justamente de lutar por melhorias na qualidade do ensino no curso e cobrar isso sistematicamente da instituição. Tanto que foi a partir da reativação do Centro Acadêmico Sete de Agosto, é que os estudantes da Unic ingressaram com uma ação junto à Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Mato Grosso (OAB/MT), denunciando a abusiva substituição de aulas com professores em salas de aula por aulas online, apesar do curso ser presencial. As denúncias são salutares, aponta Gabriel, tanto que a partir delas muitos estudantes tomam coragem e vão em busca de seus direitos. Após a veiculação da matéria do site, estudantes o procuraram para denunciar outra forma de fraude. Desta vez envolvendo o financiamento pelo Fies.

Alunos do curso afirmam terem sidos abordados por funcionários da Unic, que abertamente cobravam propina para liberar a bolsa com recursos do Governo Federal. “Não acredito que a administração tenha conhecimento da ação destes funcionários, por isso vamos procurar a reitoria e formalizar os fatos, para que as providências sejam tomadas”, destaca o estudante. Uma estudante de psicologia também procurou a reportagem, dizendo que não deve mais continuar o curso na instituição, pois simplesmente se sente abandonada e até já foi mal tratada por funcionários ao pedir informações. Apesar do alto custo da mensalidade, os acadêmicos não contam com o que está proposto na grade curricular e quando vão questionar a instituição são intimidados ou ignorados.

Professores também apontam a desvalorização da categoria, que teve salários reduzidos, a partir do momento em que a instituição cortou o pagamento de hora atividade. A remuneração visava pagar pelas horas que o professor empregava na preparação de aulas e orientação aos estudantes, fora de sala de aula. A substituição de vários professores por aulas on line é outra modalidade adotada e que afeta diretamente a qualidade do ensino.

A opinião também é compartilhada pela OAB/MT, garante o advogado Mário Medeiros Neto, membro da
Comissão de Ensino Jurídico da entidade. Segundo ele, em decorrência da denúncia do Centro Acadêmico, a Comissão tem acompanhado a situação junto a Unic. Representantes da universidade e acadêmicos foram ouvidos e o processo ainda está em andamento, para apurar o que vem ocorrendo em relação à substituição de aulas presenciais por on line. Medeiros lembra que o procedimento é permitido pelo
Ministério da Educação (MEC), mas existem critérios a serem observados, para que não se comprometa a
qualidade de ensino. Ressalta que para a OAB a preferência é por aulas presenciais, que sempre
possibilitarão maior aprendizado aos alunos e valorizam os professores, fazendo com que se preparem cada vez mais para as aulas.

Quanto às denúncias de fraudes na aprovação dos estudantes, a Comissão não recebeu ainda nenhuma
denúncia sobre os fatos. Mas garante que está pronta a atuar, caso seja provocada. Caso os fatos se comprovem, lamenta o fatopois este tipo de artifício possibilita que profissionais despreparados ingressem no sistema jurídico, interferindo na qualidade de todo o trabalho, em diversas instâncias, trazendo inclusive prejuízos para a sociedade. Em nota, a Polícia Federal informa que faz parte de sua competência constitucional apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei.

Tendo em vista que o Financiamento Estudantil (Fies) é um programa do Ministério da Educação destinado a financiar a graduação na educação superior de estudantes, qualquer irregularidade ou crime envolvendo o programa, a Polícia Federal deverá atuar. Mas, para que isso ocorra, a PF deverá ter elementos e evidências concretas do cometimento de ilícitos. Reforça, contudo, que até sextafeira (2), não recebeu qualquer procedimento, envolvendo as supostas fraudes na instituição citada. Informa ainda que qualquer pessoa que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito.

OUTRO LADO - A Unic, conforme anuncia em seu portal, possui mais de 23 anos de atuação em Mato Grosso, com 20.596 alunos matriculados, 22.139 alunos formados em graduação, 7.744 em pós-graduação e 63 nos cursos de mestrado, nos cinco campi implantados em todo o Estado. Ao ser questionada sobre as denúncias, a instituição, em nota, informou: “Em resposta ao Jornal A Gazeta, sobre a suposta adulteração de notas, a Unic esclarece que encaminhou o caso para as autoridades policiais. Em
compromisso com a transparência, a instituição coloca-se à disposição das autoridades para auxiliar na investigação e, ainda, instaurará um processo interno de sindicância, por meio de uma comissão administrativa, para apuração do fato relatado. Caso seja comprovado o envolvimento de qualquer membro da comunidade acadêmica no suposto episódio, medidas punitivas serão tomadas”.

 

 
 
 
 
 
 
 
 
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