Mato Grosso é o 9º estado do país em casos de morte violenta de mulheres, e o segundo do Centro-Oeste, com índice acima da média nacional, entre os anos de 2009 e 2011. Os dados constam do estudo “Violência contra a mulher: feminicídios no Brasil”, divulgados nesta quarta-feira (25) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O feminicídio é a morte causada pelo fato da vítima ser mulher. No Brasil, de 2009 a 2011, ocorreram 16.993 mortes, o que resultou em taxa de 5,82 mulheres assassinadas por grupo de 100 mil habitantes. Em Mato Grosso, esse índice é de 6,95. A maior incidência do país é no Espírito Santo (11,24) e, a menor, no Piauí (2,71). Em cerca de 40% dos homicídios, o autor é parceiro íntimo da vítima.
O estudo também revelou que a Lei Maria da Penha, que começou a valer em setembro de 2006, não teve impacto para reduzir as taxas anuais de mortalidade por agressões. Entre 2001 e 2006, esse índice foi de 5,28. No período de 2007 a 2011, a incidência foi de 5,22. Em 2007, ainda houve queda nos números de casos (4,74), mas, nos anos seguintes, a taxa voltou a subir. Em 2011, ficou em 5,43.
"O problema não está no funcionamento da lei. O problema é que ela não é aplicada no país. No Brasil, 85% das pessoas são a favor dessa lei, que é de primeiro mundo. E 20% acham que deveria ser ainda mais dura", afirmou a promotora de Justiça Lindinalva Rodrigues Costa, coordenadora do Núcleo das Promotorias Especializadas no Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar de Cuiabá.
Lindinalva trabalhou como auxiliar da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência Doméstica do Congresso Nacional e viajou por vários estados para debater o assunto. "O que a gente percebe é que não há plantões nas delegacias para esses crimes e há omissões e precariedades. Isso porque nas capitais a situação ainda é um pouco melhor. Porque, no interior, a mulher simplesmente não tem para onde correr", disse.
Para a promotora, que foi a primeira do país a aplicar a lei, Cuiabá apresentou avanços nos últimos anos. "Aqui, os homicídios de mulheres são tratados com a Lei Maria da Penha. É a única cidade do país que faz isso. Em outros lugares, são investigados como crimes comuns. E, nessa vala comum, as coisas ficam ainda mais difíceis".
Educação e campanhas
Lindinalva disse acreditar que campanhas educativas e preventivas são as únicas formas de evitar mais mortes, principalmente cometidas pelos parceiros das vítimas. "É preciso mudar essa mentalidade de alguns homens de acharem que são donos das mulheres. Porque em um momento de fúria ou raiva, ele vai matar, e não existe lei que vai impedir isso. O 'não' da mulher, quando ela não quer mais uma relação, deve ser respeitado", frisou.
A promotora afirmou ainda que existe muito machismo por parte dos próprios 'operadores do direito'. Em muitos casos, eles desconfiam da palavra da mulher, quando ela procura a polícia para denunciar agressões ou abusos. "Já presenciei um caso, fora de Mato Grosso, em que um delegado exigiu que uma mulher apresentasse duas testemunhas para que ele registrasse boletim de ocorrência de agressão", exemplificou.
Perfil das vítimas
Os números mostram que, no Brasil, uma mulher morre a cada uma hora e meia de causas violentas, o que representa 472 mortes por mês e 15,52 por dia. As principais vítimas são negras (61%) e com idade entre 20 e 29 anos (31%).
As maiores concentrações de morte de mulheres negras estão no Nordeste (87%), Norte 983% e Centro-Oeste (68%). A baixa escolaridade também foi constatada na maior parte dos casos: 48% tinham até 8 anos de estudo, entre as vítimas com mais de 15 anos de idade.
Armas e final de semana
Metade dos assassinatos é cometida com arma de fogo e 34% com arma cortante ou perfurante. De acordo com a pesquisa do Ipea, as mortes ocorrem, na maioria das vezes, em via pública (31%) e no domicílio (29%). E a maior parte dos casos ocorre no final de semana (36%) - somente os domingos concentram 19% dos assassinatos de mulheres.