Por unanimidade, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT), reformou sentença da juíza Cláudia Anffe Nunes da Cunha, da 60ª Zona Eleitoral de Campo Novo do Parecis, que havia determinado a cassação do diploma do prefeito Rafael Machado e do vice, Antonio Cesar Brolio, ambos do PSL. Seguindo voto do juiz Bruno D’Oliveira Marques, relator do recurso, a Corte Eleitoral firmou entendimento de que vídeos institucionais antigos gravados pelo prefeito não tiveram reflexos no pleito de 2020, quando ele foi reeleito para mais um mandato.
Com isso, os gestores permanecerão no comando de Campo Novo do Parecis por mais quatro anos. A Ação de Investigação Eleitoral (Aije) foi ajuizada por uma coligação adversária em outubro do ano passado pedindo liminar para obrigar a retirada das redes sociais e do site da Prefeitura, de vídeos hospedados no decorrer dos últimos quatro anos. A tese de abuso de abuso de poder político mediante desvirtuamento das propagandas institucionais, acolhida pela juíza de 1ª instância, foi derrubada por 7 votos no pleno do TRE.
“Não me parece, diante dessas circunstâncias, tivemos vídeos postados em 2017, 2018, 2019 e começo de 2020. Não me parece que esses vídeos, são 30 vídeos durante 40 meses, não me parecer que esses vídeos, em que há, eu insisto, não tenho dúvidas: violação ao princípio da impessoalidade. Entretanto, não há provas de que trouxeram reflexos para as eleições”, votou o relator Bruno Marques.
Em seguida, ele continuou explicando os motivos pelos quais reformou a sentença que havia cassado o prefeito e o vice-prefeito. “O reflexo para as eleições é imprescindível pra que o artigo 74 da lei geral das eleições seja agredido. E se não teve reflexos não podemos falar de violação à lei eleitoral. Podemos falar de violação a outras normas, me parece que entendimento é diverso, seria subestimar a vontade do eleitor, seria uma agressão à vontade popular dizer que esses vídeos postados pelo prefeito foram capaz de refletir na vontade do eleitor. Me parece que seria uma conclusão muito grave da Justiça Eleitoral, violadora da soberania popular”, afirmou o relator em seu voto.
A coligação “É a vez do Povo”, encabeçada pelo candidato derrotado na disputa de 2020, Clóvis de Paula (PSC), sustentou que as propagandas exaltaram a figura do prefeito que apareceu e apresentou boa parte dos materiais publicitários disseminados nas redes sociais e no site de Campo Novo do Parecis. Citou ainda uso eleitoreiro de obra pública, pois ocorreu asfaltamento e recapeamento de ruas em plena campanha eleitoral de 2020.
O Ministério Público Eleitoral deu parecer pela manutenção da condenação e defendeu que o recurso fosse acolhido parcialmente apenas para afastar a anotação de decretação/anotação de inelegibilidade sobre o vice-prefeito Antônio Brólio. O advogado Rodrigo Terra Cyrineu, representante da coligação denunciante, também defendeu que a cassação fosse mantida.
“Estamos a tratar de inúmeros vídeos no qual o prefeito foi até alcunhado pelo promotor de origem de ‘show man’ porque ele protagonizou todas as publicidades institucionais e fez isso com o caráter especifico de tirar proveito eleitoral violando, portanto, o parágrafo o1º do artigo 37 da Constituição Federal”, colocou Cyrineu. Contudo, o parecer do MP e o entendimento da parte autora, de conduta vedada apta a ser punida com cassação de mandato e inelegibilidade, foram desconsiderados na decisão colegiada durante julgamento nesta quinta-feira (26).
O advogado Lenine Póvoas fez sustentação oral em defesa do prefeito e do vice-prefeito e afirmou não haver qualquer abuso com relação aos vídeos institucionais. Conforme o jurista, só configuraria abuso de autoridade na hipótese de as propagandas serem veiculadas no período vedado de três meses antes da eleição. “E não foi o caso. Se essas propagandas forem publicadas ao longo do mandato e não próximo das eleições, pode ocorrer, em tese, improbidade administrativa que já foi ajuizada pelo Ministério Público Estadual. Se esses vídeos publicados há anos e anos atrás forem mantidos nas redes sociais e no site da Prefeitura durante três meses antes das eleições, em tese pode ocorrer conduta vedada, mas jamais, poderíamos admitir que vídeos de três, quatro anos atrás, configurasse abuso de autoridade e desvio de finalidade apto a macular as eleições”, sustentou.
Lenine Póvoas ressaltou que a publicação dos vídeos foi suspensa em janeiro de 2020, resultando num lapso de 10 meses antes das eleições. Afirmou tratar-se de publicações antigas, de modo que não faria sentido acreditar que eleitores iriam acessar publicações de três anos no site do município para saber como votar. “Isso seria um paternalismo excessivo, estaríamos chamando o eleitor de inábil democraticamente que ainda não conseguiu formar seu convencimento e precisa acessar redes sociais e constatar publicações de três anos atrás”, argumentou Lenine Póvoas.
DECISÃO UNÂNIME
Bruno Marques observou que dos 47 vídeos analisados, seis eram repetidos e outros 30 realmente trazem o prefeito Rafael Machado divulgando as ações realizadas pela Prefeitura de Campo Novo do Parecis, confirmando a violação do princípio da impessoalidade. Contudo, afirmou não ser possível poder concluir com segurança que os vídeos antigos tiveram reflexos no período eleitoral a ponto de violar o bem jurídico tutelado pela norma eleitoral. “Fazendo uma análise de cada um dos vídeos temos 30 em que o prefeito realmente apareceu nos vídeos. Na maioria deles, ele apresenta as ações do Município. Em alguns, a imagem do prefeito ou autoridade aparecer no vídeo me pareceu um tanto quanto indissociável, a norma deve ser aferida de forma sistemática, que a população tem direito de ser informada”, pontou.
Na maioria das gravações o prefeito aparece como narrador de ações do município violando o artigo 37, parágrafo 1º. “Mas não me parece que essa conduta tenha violado o artigo 74 da lei das eleições”, disse o relator pontuando não ser possível afirmar com clareza a extensão e alcance das publicações. “Me parece que o cidadão não vai ficar entrando em mídia social de município pra ver vídeo institucional de prefeitura. Então, essa é uma presunção que decorre da própria experiência comum que nós temos. E se ela é uma presunção, deve ser afastada por prova em sentido contrário. Que prova é essa: qual foi a extensão que esses vídeos tiveram”, ponderou Bruno Marques.
Ele observando que para fins de improbidade não é necessária essa aferição, pois já configura violação direta à norma podendo ser condenado à reparação do dano que causou pelos gastos, pagamento de multa civil. “Pode ser que nem seja condenado a suspensão dos direitos políticos se o juiz ou tribunal entender que essa pena é muito gravosa para o caso concreto”, ponderou.
Outro ponto afastado pelo relator foi sobre as obras de asfalto. Segundo ele, foi uma ação desenvolvida ao longo do tempo, pois conforme o prefeito, o Município recebeu uma emenda parlamentar para construir uma usina de asfalto em meados de 2017 e na sequência ele iniciou a licitação, construiu a usina e depois começou a licitação para uma empresa executar as obras. “De modo que não me parece que se trate de uma ação que tenha sido praticada em desacordo com as normas com intuito abusivo. Com essas considerações, encaminho meu voto no sentido de dar provimento ao recurso para reformar a sentença proferida pelo juiz de primeiro grau e julgar improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral”, votou Bruno Marques.
O relator foi acompanhado pelos juízes Jackson Francisco Coleta Coutinho, Gilberto Lopes Bussiki, Armando Biancardini Candia e Ciro José de Andrade Arapiraca. E também, pelos desembargadores Nilza Maria Pôssas de Carvalho e Carlos Alberto Alves da Rocha, presidente do TRE.