O presidente Jair Bolsonaro vai anunciar nesta quarta-feira (24), às 16h, no Palácio do Planalto, as regras para a liberação dos saques de contas ativas e inativas do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). A expectativa inicial era de que o anúncio fosse feito durante a cerimônia de comemoração dos 200 dias do governo Jair Bolsonaro, na última quinta (18), mas a divulgação foi adiada por ajustes na proposta.
O professor de MBAs da FGV (Fundação Getulio Vargas) Mauro Rochlin diz que o impacto da medida vai depender da maneira como o governo liberar os recursos: se o dinheiro vai poder ser sacado aos poucos ou de uma vez. “Como a gente ainda não sabe como vai ser, se a liberação for a conta gotas, o impacto vai ser muito pequeno. Deve ser menor do que 0,3% do PIB (Produto Interno Bruto), tendo como referência o que aconteceu em 2017”.
A situação muda um pouco de figura se a liberação acontecer de uma vez. Rochlin diz que “se acontecer de uma maneira mais concentrada, se tiver valor próximo de R$ 40 bilhões, o impacto ainda assim não é dos maiores, mas aumenta”. A expectativa inicial do governo é que os saques movimentem R$ 42 bilhões.
Em 2017, o governo de Michel Temer liberou R$ 44 bilhões do FGTS. O crescimento da economia foi de 1% naquele ano e a medida foi responsável por parte deste percentual.
O financista Fabrizio Gueratto afirma que, isoladamente, a liberação do saque do FGTS não tem impacto significativo na economia. Para o especialista, a liberação só faz sentido se somada à aprovação da reforma da Previdência, que já passou em primeiro turno na Câmara dos Deputados, e a outras medidas que o governo federal deve anunciar ao longo do ano.
Para Gueratto, é um erro utilizar o dinheiro do FGTS para consumo, mas isto acontece muitas vezes devido à falta de educação financeira do brasileiro. “De qualquer maneira, o dinheiro é positivo [para a economia] por mais que as pessoas façam o erro de consumir”.
“Em governos passados, incentivaram muito o consumo. E a gente viu que a economia focada no consumo não dá certo, porque uma hora a conta explode”, explica. Segundo Gueratto, o governo atual é liberal e, por isso, haverá a liberação de apenas uma parte das contas do FGTS, para que o brasileiro ainda tenha uma reserva caso seja demitido.
Como usar o dinheiro do FGTS
Gueratto explica que existem três boas formas de usar o dinheiro extra: investir em uma aplicação mais rentável que a conta da Caixa, que rende 3% ao ano, pagar dívidas ou investir em algum produto que vai gerar “economia líquida e certa” ou lucro.
No último caso, Gueratto exemplifica: um bom investimento para um motorista de aplicativo, por exemplo, é comprar um kit gás para economizar com combustível no futuro, ou um confeiteiro investir em uma batedeira melhor para conseguir encomendas maiores e aumentar a renda extra.
Para Rochlin, “todo mundo tem que tirar [das contas do FGTS] o máximo que o governo permitir, porque o rendimento é muito pequeno. Qualquer aplicação na poupança, por exemplo, gera ganhos maiores”. A caderneta é a preferida dos brasileiros, principalmente por medo de perder dinheiro com outros tipos de aplicações, segundo pesquisa divulgada em junho pela CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) e SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito).
“O pior que pode acontecer é ficar aplicado no fundo”, afirma. Hoje, a poupança, que é a aplicação com menor rendimento, tem taxas um pouco menores do que 6%, o que representa quase duas vezes mais do que a conta do FGTS. Rochelin diz que os brasileiros endividados devem usar o dinheiro do saque para acabar com as pendências, priorizando aquelas com juros mais caros, como cheque especial e cartão de crédito — 320,9% e 299,8% ao ano, respectivamente, segundo os dados de junho do BC (Banco Central).
Depois disso, o próximo passo é poupar e, por fim, usar parte do dinheiro para consumo.
Antes e depois do FGTS
Hoje, o FGTS é uma reserva financeira. Os brasileiros que trabalham com carteira assinada têm descontos mensais na folha de pagamento para a formação do FGTS. Quando o funcionário é demitido sem justa causa, pode sacar os recursos do Fundo.
Os funcionários que pedem demissão não têm direito ao saque deste dinheiro, que é administrado pela Caixa Econômica Federal.
O advogado previdenciário Fernando Peluso, sócio do escritório Peluso, Stüpp e Guaritá Advogados, afirma que depois do anúncio do governo federal, a medida vai precisar ser aprovada pelo Congresso Nacional para que a liberação tenha caráter legal.
“A lei atual tem regras específicas para o saque. O primeiro passo é editar um texto que autorize a mudança. A partir do momento que tem a lei, está resolvida a questão”, diz Peluso. A proposta precisa ser aprovada em um turno na Câmara dos Deputados e no Senado Federal para então seguir à sanção presidencial.
Mesmo que a medida seja anunciada pelo governo nesta quarta, a liberação de fato depende da aprovação da lei. Não é possível saber quanto tempo o Congresso vai levar para apreciar o texto, principalmente porque a aprovação da reforma da Previdência é a prioridade nas Casas.