O juiz Geraldo Fidélis Neto, titular da 2ª Vara Criminal de Cuiabá, negou o pedido de parcelamento da multa de R$ 1,3 milhão, imposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pela sua condenação na Ação Penal 470 – O Mensalão. O magistrado determinou ainda que ela seja exonerado dos quadros de servidores efetivos do Instituto Médico Legal (IML).
Com a negativa do parcelamento da multa, o magistrado deferiu que a Vara de Execuções Fiscais deve ser oficiada para fazer a execução dos bens do condenado, que conforme declaração feira por Henry na Justiça Eleitoral, passa dos R$ 1,4 milhão, valor suficiente para quitar a multa.
Fidelis sublinhou que, caso o pedido de parcelamento fosse acatado, Henru terminaria de pagar a dívida com a Justiça aos 110 anos de idade. “Para quitar a pena de multa imposta pela decisão do Supremo Tribunal Federal, cujo valor é R$ 1.372.112,35, mesmo se percebesse a somatória de sua última remuneração (o que não mais acontecerá, ante a perda da função pública), ou seja, R$ 7.168,99, descontando-se 30%, conforme pretende, demoraria mais de 53 anos para total adimplemento. Como o reeducando Pedro Henry, no próximo mês de abril fará 57 anos de idade, a quitação, nessas condições, aconteceria quando o mesmo tivesse 110 anos de idade”, diz trecho da decisão proferida nessa terça-feira (25).
Sobre a exclusão de Henry do quadro de servidores do IML, o magistrado justifica que houve “decisão expressa e específica sobre a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da Lei 9613/1998, estabelecendo, ainda, que esta se dará pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada”, relata na decisão.
Deste modo, Fidelis determinou que a Secretaria de Administração do Estado (SAD) deve ser intimada imediatamente “para que cumpra na íntegra o acórdão, abstendo-se de efetuar todo e qualquer pagamento ao reeducando Pedro Henry Neto, bem como, promova o desligamento d’ele dos quadros da Administração Pública de Mato Grosso”.
Henry já atuou como legista no IML de Cuiabá, posto que foi deixado de lado em 1996, quando foi eleito deputado estadual. Antes disso, o médico legista atuava como servidor do Estado desde 1986.
O ex-deputado foi preso no dia 13 de dezembro de 2013, após se apresentar espontaneamente à Polícia Federal em Brasília (DF). No mesmo dia, ele teve a prisão decretada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Antes, entregou sua carta de renúncia ao mandato de deputado para a Mesa Diretora da Câmara Federal.
Henry está recolhido no Anexo I da Penitenciária Estadual do Pascoal Ramos, que funciona anexo à Delegacia Especializada de Vigilância e Capturas (Polinter), no bairro Centro América.
Veja integra da decisão:
Após detida pesquisa feita pelos ínclitos Promotores de Justiça, no corpo do acórdão dos referidos autos da AP 470, exatamente no volume 264, registrado no CD-R – fls. 151, cuja cópia foi juntada no presente PEP às fls. 94/97, houve enfrentamento da questão “interdição do exercício de cargo público”, precisamente na dosimetria da pena de PEDRO HENRY, ocasião em que foram consignadas, ipsis litteris, as seguintes determinações como efeitos da condenação exarada:
“Tendo em vista a necessidade de ressarcir os valores lavados pelos réus e prevenir a repetição do ilícito aqui detalhado, e considerando, ainda, todas as circunstancias levadas em conta para a fixação da pena, decreto, com apoio no art. 7º da Lei 9613/98 e nos arts. 91 e 92 do Código Penal:
“(1) perda, em favor da União, dos bens, direitos e valores objeto do crime, bem como do produto de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo condenado com a prática do fato criminoso, ressalvado, obviamente, o direito das pessoas jurídicas de direito público ou privado lesadas;
(2) a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da Lei 9613/1998, pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada” – sublinhei.
Desta feita, dentre os efeitos da condenação do recuperando, encontra-se a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e, portanto, a interdição de exercer atividade de médico legista no Instituto Médico Legal, já que referida função constitui função pública.
Observa-se que referido efeito não foi objeto de voto divergente, de modo que, permaneceu incólume quando da exposição de votos, o que não ocorreu com a pena privativa de liberdade imposta, conforme se extrai da extensa íntegra do acórdão constante do CDR de fls. 151.
Cumpre salientar que a propalada “interdição do exercício de cargo público” não poderia ser aplicada de plano, pois, como um dos efeitos específicos da Condenação, a teor do artigo 92, inciso I, alíneas “a” e “b”, do Código Penal, haveria de ser mencionada no acórdão, como, de fato, aconteceu.
Repito que houve decisão expressa e específica sobre a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da Lei 9613/1998, estabelecendo, ainda, que esta se dará pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada, contemplando o disposto, in contrario sensu, no parágrafo único do artigo 92 do Diploma Repressivo.
Portanto, em atenção à ordem da Excelsa Corte, haverá de ser intimada, imediatamente, a Secretaria de Administração, para que cumpra na íntegra o acórdão, abstendo-se de efetuar todo e qualquer pagamento ao reeducando Pedro Henry Neto, bem como, promova o desligamento d’ele dos quadros da Administração Pública de Mato Grosso.
Melhor sorte não possui o sentenciado Pedro Henry Neto quanto ao pleito de parcelamento do pagamento da pena de multa, no montante de 30% (trinta por cento) de seus rendimentos.
É verdade que o artigo 50 do Código Penal c/c o artigo 169 da Lei nº 7.210/84, preveem a possibilidade de o pagamento da pena de multa ser parcelado, com desconto mensal dos vencimentos do reeducando, desde que devidamente analisadas as circunstâncias.
Para busca ilustrar, na prática, o que implicaria o efeito do parcelamento pretendido pelo recuperando, observa-se, didaticamente, o seguinte:
1) inicialmente, sua prestação de serviços, exclusiva, ao Hospital de Medicina Especializada LTDA – Hospital Santa Rosa, para uma jornada, de segunda a sexta-feira de oito horas e mais quatro horas no sábado, receberia R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais), conforme contrato de fls. 165/171;
2) contudo, houve um termo aditivo, constante às fls. 172/173, onde o sentenciado adotou um novo horário de trabalho, ou seja, de segunda-feira à sábado, no período matutino, por seis horas por dia, em que sua remuneração seria de R$ 6.000,00 (seis mil reais), junto ao Hospital de Medicina Especializada LTDA – Hospital Santa Rosa e, também, ainda que sem autorização, passou a trabalhar, de segunda à sexta-feira, na etapa vespertina, por seis horas, perante a Diretoria Metropolitana de Medicina, deixando, inclusive, de mencionar seus rendimentos;
3) em razão de a jornada de trabalho exceder o limite traçado no artigo 33 da Lei 7.210/84, foi reduzido o expediente prestado pelo reeducando ao Hospital de Medicina Especializada LTDA – Hospital Santa Rosa, para duas horas, nas manhãs, de segunda a sexta-feira e seis horas aos sábados, bem como, sua remuneração diminui para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), de acordo com o segundo aditivo contratual, acostado às fls. 195/196; no período vespertino, continuou, sem informar a remuneração, junto a Diretoria Metropolitana de Medicina;
4) o Diretor Metropolitano de Medicina Legal informou, às fls. 235, que o recuperando cumpria 44 horas semanais, e, às fls. 245, o Secretário de Administração do Estado noticiou que o valor de seu subsidio mensal é de R$ 4.668,99 (quatro mil, seiscentos e sessenta e oito reais e noventa e nove centavos).
Logo, para quitar a pena de multa imposta pela decisão do Supremo Tribunal Federal, cujo valor é R$ 1.372.112,35 (Um milhão, trezentos e setenta e dois mil, cento e doze reais e trinta e cinco centavos), mesmo se percebesse a somatória de sua última remuneração (o que não mais acontecerá, ante a perda da função pública), ou seja, R$ 7.168,99 (sete mil, cento e sessenta e oito reais e noventa e nove centavos), descontando-se 30% (trinta por cento), conforme pretende, demoraria mais de 53 (cinquenta e três) anos para total adimplemento. Como o reeducando Pedro Henry, no próximo mês de abril fará 57 (cinquenta e sete) anos de idade, a quitação, nessas condições, aconteceria quando o mesmo tivesse 110 (cento e dez) anos de idade.
Ora, tal fato é inadmissível!
Uma decisão adversa seria prestigiar a impunidade, máxime porque é sabido que, em nosso ordenamento jurídico, a pena possui caráter pessoal, individual e intranscendente e, dessa forma, não passará da pessoa do condenado. Além disso, não se pode olvidar que a reprimenda tem natureza sancionatória.
Nessa seara de entendimento, nas condições expostas, será ao condenado impossível a quitação total da pena.
De mais a mais, após análise das condições socioeconômicas do recuperando, bem como, ante a natureza dos crimes que motivaram a condenação, conclui-se que não restou comprovado o estado de penúria ou a miserabilidade jurídica do sentenciado ou ainda, que o pagamento integral incidiria sobre recursos indispensáveis à sua sobrevivência e de sua família, elementos essenciais ao deferimento do parcelamento da pena de multa.
Ao contrário, posto que se extrai dos autos o fato de que o penitente possui bens suficientes ao cumprimento da reprimenda, como se vê da declaração de bens apresentada à Justiça Eleitoral, acostada às fls. 262/263. Tal comprovação é reforçada pelos documentos trazidos pelo Ministério Público, às fls. 267/273.
Nossos tribunais, inclusive o de Mato Grosso, já apreciaram situações semelhantes, verbis:
Agravo em execução. Parcelamento da pena de multa. Número de parcelas excessivo, em valores ínfimos. Impossibilidade. Pena pecuniária que possui natureza de sanção. Irrazoabilidade do pedido. Decisão acertada. Agravo improvido. (TJSP, 4ª Câmara de Direito Criminal, EP 0171027-37.2012.8.26.0000 SP, rel. Des. Luis Soares de Mello, j. 05/03/2013, Publicação 06/03/2013).
“Embora autorizado na lei, o parcelamento da multa deve ser aplicado apenas para o réu que comprovar de forma satisfatória não ter condições financeiras de arcar com a referida despesa numa única vez” (TRF 4ª Região, 8ª Turma, AGEPN nº 200204010271712/RS, Rel. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro, DJU 02/10/2002).
APELAÇÃO CRIMINAL – FURTO QUALIFICADO – RECURSO DEFENSIVO – PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR 02 (DUAS) RESTRITIVAS DE DIREITOS – PLEITO PELA MODIFICAÇÃO DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA – ALEGADA FALTA DE CONDIÇÃO FINANCEIRA PARA EFETUAR O PAGAMENTO – INVIABILIDADE – HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA – SITUAÇÃO FÁTICA QUE DEMONSTRA A CAPACIDADE ECONÔMICA DO RÉU – POSSIBILIDADE DE PARCELAMENTO DA PENA – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL PARA AVALIAR AS CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS NO MOMENTO DO PAGAMENTO – RECURSO DESPROVIDO.
Não há que se falar na impossibilidade de prestação pecuniária quando o Acusado não comprova a alegada hipossuficiência, mormente se as circunstâncias concretas denotam que possui condições econômicas de saldar a reprimenda, inexistindo óbice para que o valor seja parcelado de acordo com a renda mensal do apenado. Eventual impossibilidade de quitar a pena pecuniária em razão da suposta hipossuficiência econômica deve ser analisada pelo juízo da execução penal, o qual poderá avaliar a situação financeira do sentenciado na data do efetivo pagamento. Recurso desprovido” (TJMT, 2ª Câmara Criminal, Apelação nº 0001620-21.2011.8.11.0021 - 119035/2012, j. 28/08/2013, rel. Des. Pedro Sakamoto, Publicação em 04/09/2013).
Não pode passar sem registro, a anotação do Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, do TRF da 4ª Região, na qualidade de relator do Acórdão nº 0002932-31.2009.404.7102/RS, publicado em 13/05/2010, no sentido de que “é entendimento consolidado que o parcelamento da prestação pecuniária deve ser concedido em situação excepcional, apenas quando houver grave comprometimento da subsistência do condenado, ou de seus dependentes, de modo que não se retire o caráter reprovador e repressor do apenamento”.
E, analisando a questão em concreto, trazida no corpo do Acórdão nº 0002932-31.2009.404.7102/RS, o referido Desembargador Paulo Afonso Brum Vaz sentenciou: “Nessas condições, penso que proceder à fragmentação pretendida da pena pecuniária constitui verdadeiro desserviço à administração da justiça, na medida em que resulta na premiação do comportamento criminoso em detrimento dos cidadãos cumpridores de seus deveres, bem como na disseminação do senso de impunidade, com o que não se pode concordar”.
In casu, consoante restou evidenciado, os bens do penitente respondem, de forma suficiente, ao pagamento da pena de multa imposta, o que poderá ser meticulosamente aferido, com a amplitude que o caso requer, inclusive e principalmente à defesa, na seara cível quando da cobrança da dívida de valor, e não no juízo da Execução Penal.
Por tudo o que foi exposto, de forma análoga ao entendimento ministerial, DEIXO DE ACOLHER o pedido de parcelamento formulado e, em face do inadimplemento da pena de multa imposta, determino a imediata comunicação à Fazenda Pública, a fim de que promova a execução no Juízo competente.
Determino, também, a intimação da Secretaria de Administração, para que cumpra na íntegra o acórdão exarado pelo STF, isto é, abstenha-se de efetuar todo e qualquer pagamento ao recuperando Pedro Henry Neto, bem como, promova seu desligamento dos quadros da Administração Pública de Mato Grosso. Encaminhe-se junto ao referido ofício, cópias do decisum constante às fls. 94/97, bem como, cópia do CDR de fls. 151;
Como não restou abordado em sua manifestação, diga, o Ministério Público, sobre o pedido de fls. 242/244, que versa sobre remição de pena pela realização de curso profissionalizante, como auxiliar administrativo, junto ao Instituto Universal Brasileiro.
Intime-se a defesa para apresentar, querendo, nova jornada de trabalho do reeducando, dentro dos limites previstos no artigo 33 da Lei de Execução Penal, bem como, a sua respectiva remuneração para, depois de ouvido o Ministério Público, apreciar eventual autorização.
Dê-se ciência ao digno representante do Ministério Público e à Defesa.
Expeça-se o necessário, com a máxima urgência, ainda na tarde de hoje – 25/03/2014.