O Tribunal de Contas do Estado (TCE) sugeriu ao Governo de Mato Grosso a criação de um Fundo Soberano que auxiliaria a reduzir a dependência que o Estado tem do agronegócio, diminuindo o impacto em caso de uma eventual crise futura.
A recomendação foi feita ao Executivo após auditoria operacional nas receitas estaduais que apontaram algumas fragilidades. A fiscalização, segundo o relator, conselheiro Antônio Joaquim, visou o apontamento de melhorias dos mecanismos do Estado.
Um ponto evidenciado na auditoria foi o paradoxo de o Estado ser líder na produção agrícola e recordista em arrecadação, ficando em 13º lugar entre os PIBs do Brasil, mas ter alta concentração fundiária e má distribuição de renda, com quase 1/5 da população dependente de auxílios do Governo, como o Bolsa Família.
Se ficarmos dependendo só do agro, da exportação de commodities, Mato Grosso vai sempre ser um estado rico, com PIB alto, renda per capita alta e com um povo que não vai ter acesso a essa riqueza
Ao MidiaNews, Antônio Joaquim explicou que não se trata de uma crítica simples ao agro – ou à dependência que a economia do Estado evidentemente tem desse setor -, mas da necessidade de achar uma forma alternativa de melhorar a distribuição de renda e geração de emprego usando o agro como alavancador.
“Nos últimos dezoito anos, Mato Grosso cresceu em média bem mais que o Brasil. Isso é fruto do crescimento do agro. Mas não adianta ficar criticando o agro, que é um modelo concentrador tanto de recursos quanto no aspecto fundiário”, disse.
“O que as autoridades públicas devem fazer, na nossa opinião, é criar algum tipo de mecanismo para poder estimular de forma contundente a indústria do agro. Não há outro caminho na macroeconomia do Estado que não seja a industrialização do agro para poder gerar renda e emprego”, explicou.
O conselheiro explicou que o agronegócio é a vocação de Mato Grosso, mas que se o Estado insistir em se manter exclusivamente como exportador de commodities sem nenhum tipo de outra iniciativa, por exemplo, de agregar valores a esses produtos ou industrialização para movimentar a economia, pode acabar em uma situação desagradável para população no futuro – com riquezas e terras concentradas nas mãos de poucos.
“Se ficarmos dependendo só do agro, da exportação de commodities, Mato Grosso vai sempre ser um estado rico, com PIB alto, renda per capita alta e com um povo que não vai ter acesso a essa riqueza”, afirmou.
Segundo o relator, o êxito da industrialização do agro se daria por meio não apenas da exportação dos produtos primários – como o milho, por exemplo –, mas de seus derivados, já pegando um gancho na melhoria da logística no Estado com o aumento da malha ferroviária prevista para os próximos anos.
A exportação vai sempre continuar. Mas nós temos que usar no mínimo metade da produção para ser industrializada aqui, para poder gerar renda e emprego e ter outra alternativa
“A indústria não precisa instalar aqui e pensar que vai vender apenas para Mato Grosso, porque realmente seria inviável. Mas por exemplo, nós importamos cápsulas de café da Holanda. O café vai bruto para lá e vem as cápsulas para cá”, disse.
“Nós temos que fazer as cápsulas aqui e mandar para o mundo inteiro. Temos que fazer sucrilhos de milho aqui e mandar para o mundo inteiro”, exemplificou.
“A exportação vai sempre continuar. Mas nós temos que usar no mínimo metade da produção para ser industrializada aqui, para poder gerar renda e emprego e ter outra alternativa”, completou.
Fundo soberano
Ele citou exemplos exitosos de fundos soberanos criados no país, como nos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo. Nessas duas unidades da federação, em caso de oscilação ou adversidades no mercado de petróleo e gás natural, respectivamente, a estabilidade da economia fica assegurada.
Em resumo, o fundo serviria para a formação de uma poupança compensadora diante de situações de crise que tornem as finanças públicas deficitárias. Antônio Joaquim também citou o exemplo mais famoso ainda, que vem lá dos países árabes.
“São três trilhões de dólares que eles têm exatamente o cuidado, a prudência, porque se um dia tiver problema com o petróleo, eles têm esse fundo trilhardário para inventar uma economia alternativa”, disse.
“Basicamente é isso. É no sentido da eventualidade de uma crise. Mas eu estendo também outra função que ele teria, que eu considero tão ou mais importante do que fazer ‘colchão’, seria financiar o fomento da industrialização do agronegócio no Estado”, defendeu.
Avaliação do Governo
A auditoria operacional do TCE resultou em 44 recomendações - entre elas a criação do fundo - que foram acolhidas por unanimidade pelo Pleno no final de abril e encaminhadas aos gestores dos órgãos do Governo que passaram pela fiscalização, como a Secretaria de Estado de Fazenda e a Procuradoria-Geral do Estado.
"Nós demos um prazo de 120 dias para que os gestores proponham atividades para consolidar e materializar essas propostas de melhorias que fizemos. A partir daí fazemos um contrato, que podemos denominar de Termo de Ajustamento de Gestão, para que seja cumprido, no prazo determinado em comum acordo com o gestor, essas melhorias propostas", explicou o conselheiro.